16 dezembro 2014

Sai a primeira Sentença da Drª Elaine Celina Afra Santos Dutra, Juiza de Direito de São Domingos, relacionado ao lamentável acidente que tirou a vida da Professora Cristina.

AGORA FALTA OS OUTROS RESPONSÁVEIS SEREM PUNIDOS, OU SEJA O SECRETÁRIO DE TRANSPORTES E O GESTOR MUNICIPAL.

 Dados da Parte 
 Autor  AUTORIDADE POLICIAL

 
 Reu  JAILTON SOARES BEZERRA
 Advogado(a): CARLOS HENRIQUE ALMEIDA MENDONÇA - 7187/SE

201463300164

SENTENÇA

I - Relatório
O douto presentante do Ministério Público Estadual ofereceu denúncia em face de JAILTON SOARES BEZERRA,qualificados nos autos, alegando, em suma, que este incorrera na conduta típica descrita no art. 302, parágrafo único, I, III e IV do Código de Trânsito Brasileiro.
Ressai dos autos que, no dia 25 de novembro de 2013, por volta das 13h, próximo ao Morro do Macaco, no Povoado Lagoa, o denunciado, dirigia o veículo do modelo Corsa, placa HZL 9800, em alta velocidade, e, após realizar uma ultrapassagem, perdeu o controle da direção e colidiu em um barranco de pedras, provocando o óbito da vítima CRISTINA PEREIRA SANTOS (fls. 16/20), que estava como carona.
A vítima estaria, antes de aceitar a carona do réu, na clínica Semedi, no Município de Itabaiana, local onde fazia hemodiálise, em companhia de seu filho SAULO GABRIEL PEREIRA SANTOS. Ato contínuo, solicitou que a Secretaria de Transportes de São Domingos lhe disponibilizasse um carro para retornar a este Município, sendo determinado ao acusado que realizasse o referido transporte.
Assim, o denunciado pegou a vítima e seu filho na referida clínica, e, quando retornava para São Domingos, fez uma ultrapassagem indevida, numa subida, e, ao tentar voltar para a sua mão de direção, perdeu o controle do veículo, ocasionando o acidente.

Segundo testemunhas, o réu chegou na clínica visivelmente alterado, com sinais de embriaguez, tanto que quase colidiu o automóvel com motocicletas que estavam no local. Além disso, durante a viagem, não utilizava cinto de segurança, nem solicitara o uso pelos passageiros.
Ainda segundo relatos constantes do IP, durante o trajeto, o acusado trafegava em alta velocidade, com o som alto e fumando, não se preocupando com os cruzamentos. Ademais, o sujeito ativo dirigia com apenas uma das mãos e sentia dificuldades para passar as marchas, haja vista que tem problema em um dos braços. Acrescente-se que, segundo o próprio réu, ele não possui carteira nacional de habilitação.
Após o sinistro, o denunciado teria ainda se evadido do local sem prestar socorro à vítima.

Arguindo que a conduta do réu estaria revestida de culpa, nas modalidades negligência e imprudência, pois conduzia veículo automotor visivelmente alterado, sem ligar para as regras de trânsito e com excesso de velocidade, o Ministério Público ofereceu denúncia às fls. 01/03
Boletim de Ocorrência de Acidente de Trânsito às fls. 21/25.
Laudo cadavérico às fls. 26/29.
Recebida a denúncia às fls. 44
Citado (fls. 64), o réu apresentou defesa preliminar às fls. 51/55.
Em audiência de instrução foram ouvidas as testemunhas arroladas pelo MP e pela defesa, bem como foi realizado o interrogatório e qualificação do réu.
Na mesma ocasião, o Ministério Público apresentou alegações finais de forma oral, pugnando pela condenação do réu como incurso nas penas do art. 302, parágrafo único, I, III e IV do CTB.
Ao revés, a defesa apresentou suas derradeiras alegações às fls. 91/94, pugnando pela absolvição do acusado, nos termos do art. 386, IV do CPP.
É o relatório. Passo a fundamentar para ao final decidir.

II – Fundamentos de Fato e de Direito

No caso em exame, extraindo-se da interpretação dos elementos contidos nos autos e submetidos a acurado exame, confrontando fatos, contrastando circunstâncias, daí converge à convicção de que existem provas suficientes nos autos que indiquem a responsabilidade penal do denunciado Jailton Soares Bezerra quanto à prática do crime descrito no art. 302, parágrafo único, inciso I, III e IVda Lei 9.503/97.
A materialidade delitiva restou devidamente comprovada nos autos, notadamente em se considerando o Laudo Pericial Cadavérico de fls. 26/29 e a Certidão de Óbito de fl. 16. A autoria, de igual modo, ficou evidenciada nos autos, uma vez que o denunciado Jailton Soares Bezerra, conhecido por BOCA,confessou ter sido ele a pessoa que conduzia no dia dos fatos o veículo envolvido no acidente que vitimou Cristina Pereira Santos, que veio a falecer. Apesar disto, é preciso analisar se os requisitos atinentes ao delito culposo fazem-se presentes nestes autos.
Da análise da prova oral colhida, vê-se que não há dúvidas de que o denunciado Jailton Soares Bezerra não adotou os cuidados necessários na condução do veículo envolvido no acidente sob comento, agindo com culpa na modalidade imprudência - vez que a despeito de apresentar deficiência em um dos braços, dirigia carro não adaptado à sua limitação - bem como na modalidade imperícia - já que desconhecia as regras de trânsito, não possuindo sequer habilitação para dirigir veículo destinado a transporte de passageiros.
Tanto o próprio réu quanto as testemunhas que presenciaram o momento do acidente ou o conheciam, informaram, unissonamente, que o acusado usa somente um dos braços para dirigir em razão de uma deficiência e, apesar disso, o veículo automotor que conduzia no fatídico dia, não possuía adaptação para permitir uma dirigibilidade segura e em conformidade com as limitações do acusado.
Além da imprudência, restou evidente a imperícia do réu, já que sequer possuía Carteira de Habilitação (conforme confessado pelo próprio acusado), que atestasse ser o acusado hábil a conduzir veículos automotores.
O caso em tela está caracterizado, então, pela ocorrência de dois dos elementos da culpa que responsabiliza o agente pelo evento, quais sejam, imprudência e imperícia, restando patente a modalidade culposa no delito analisado.
Ficou claro, então, que em razão de conduzir veículo em desconformidade com as regras de trânsito e sem possuir a devida habilitação, o acusado Jailton Soares Bezerraincrementou com sua conduta um risco proibido relevante e, tão relevante foi, que levou a óbito a vítima Cristina Pereira Santos. Destarte, pela teoria da imputação objetiva da conduta, aquele que cria um risco proibido (acidente de trânsito em razão de imprudência) responde pelo risco criado.
No que atine à causa especial de aumento de pena descrita no inciso I do parágrafo único do art. 302 do CTB, resta cabalmente configurada, havendo prova suficiente nos autos de que o réu não possui CNH, fato inclusive confessado pelo mesmo, perante as autoridades policial e judiciária.
Quanto à causa especial de aumento de pena prevista no inciso III do parágrafo único do art. 302 do CTB, qual seja, a omissão de socorro à vítima, entendo caracterizada no presente caso.
Segundo depoimentos das testemunhas que estiveram no local do acidente, o acusado tão teria se evadido do local, em direção ao hospital, logo após o abalroamento do veículo. É bem verdade que, em seu interrogatório, o réu aduz que prestara socorro à vítima, “pedindo a um terceiro que se encontrava no local que ligasse para o SAMU”. Todavia, a informação prestada pelo acusado é isolada, quando comparada às demais provas testemunhais, além de hesitante, posto que sequer soube declinar precisamente a quem teria pedido para prestar socorro.
Sobre o tema, o mestre FERNANDO CAPEZ, in ASPECTOS CRIMINAIS DO CÓDIGO DE TRANSITO BRASILEIRO, 2a Ed., Saraiva, São Paulo, 1999, p. 38 assim proclama:
"Socorro por terceiro: o condutor somente responderá pelo crime no caso de ser a vítima socorrida por terceiros, quando esta prestação de socorro não chegou ao conhecimento dele, porque já havia se evadido do local. Assim, se, após o acidente, o condutor se afasta do local e, na sequência, a vítima é socorrida por terceiros, existe o crime.”
Assim sendo, ainda que se considere ser verídica a informação de que o acusado buscou ajuda junto a um terceiro, o fato é que, quando se evadiu do local, o socorro à vítima ainda não tinha sido prestado, o que configura a majorante do tipo penal em espeque. Diante do que foi dito, deve ser considerado o aumento de pena da omissão de socorro previsto no inciso III do parágrafo único do art. 302, do CTB.
Imputa-se ao acusado, ainda, a prática do crime de homicídio culposo na direção de veículo automotor quando estava o condutor no exercício de sua profissão ou atividade, dirigindo veículo de transporte de passageiros, sendo esta uma causa especial de aumento de pena prevista no inciso IV do parágrafo único do art. 302 do CTB. Tal causa de aumento exige, contudo, que o autor do homicídio culposo esteja no exercício da sua profissão ou atividade, na direção do veículo automotor, Ocorre que a prova oral colhida não dá suporte probatório suficiente para se afirmar que o acusado Jailton Soares Bezerra tinha como profissão ou atividade o transporte de passageiros. É certo que há informações nos autos dando conta que o veículo envolvido no acidente era locado pelo Município de São Domingos e que o réu, em tese motorista do município, realizava o transporte de pacientes de hemodiálise. Ocorre que tais informações são nebulosas e conflitantes com os depoimentos do réu e suas testemunhas de defesa, Jeferson e Adriano, todos no sentido de que o acusado não é funcionário da prefeitura, nem tampouco lhe preta serviços, versão corroborada pelo Secretário de Administração do Município às fls. 38. Há de se ressaltar ainda que não constam nos autos quaisquer provas documentais que atestem o suposto vínculo empregatício e, assim sendo, mister afastar o reconhecimento de tal causa de aumento, em homenagem ao princípio do in dubio pro reu.


III - Dispositivo

Ipso facto, e por tudo mais do que dos autos consta, sou por JULGAR PROCEDENTE EM PARTE A PRETENSÃO PUNITIVA ESTATAL para CONDENAR o denunciado Jailton Soares Bezerra, qualificado in follio, nas penas do art. 302, parágrafo único, inciso I e III da Lei 9.503/97, tudo em consonância ao contido no art. 387 do Código de Processo Penal.
Atendendo ao sistema trifásico adotado pelo Código Penal Brasileiro, no seu art. 68, sopesadas as circunstâncias judiciais do art. 59 e o disposto no art. 49, do mesmo Codex, fixo-lhe a pena privativa de liberdade e a pena de multa, nas seguintes proporções e concretizando-as:
Em relação à conduta social e à personalidade do réu não há qualquer informação nos autos que possam ser pesados contra ele; a culpabilidade do réu mostrou-se intensa, sendo elevada a reprovação de sua conduta, pois agiu em flagrante desrespeito às regras de trânsito, realizando condução de veículo automotor sem adotar as devidas cautelas; o réu não possui antecedentes criminais (fls. 68); o motivo que levou ao cometimento do crime não restou evidenciado, não podendo, destarte, ser considerado em desfavor do denunciado; a circunstância em que ocorreu o delito mostrou-se desfavorável ao acusado; o crime gerou conseqüências graves, uma vez que levou a óbito a vítima.
Fixo a pena base em 02 (dois) e 6 (seis) meses de detenção. Não havendo circunstâncias agravantes ou atenuantes a serem valoradas, há que se considerar as causas de aumento existentes. Nesse sentir,aumento de 1/2 em razão da incidência das causas especiais de aumento de pena previstas nos incisos I e III do parágrafo único do art. 302 da Lei nº 9.503/97, perfazendo um total de03 (três) anos e 09 (nove) meses de detenção, que torno definitiva por não existirem causas de diminuição e outras de aumento de pena, devendo a pena ser cumprida em estabelecimento penal adequado, em regime aberto, em atenção ao contemplado no art. 33, § 2º, alínea “c”, do Código Penal.
Em atenção ao contido no art. 44, §2º, do Código Penal, converto a pena privativa de liberdade aplicada em uma pena restritiva de direitos na modalidade de prestação de serviços a comunidade, cuja entidade será aquela a ser designada em momento oportuno, quando da designação de audiência admonitória por este Juízo, e multa no valor de 60 (dez) dias-multa,fixando o valor unitário do dia-multa em um trigésimo (1/30) do salário mínimo vigente ao tempo do fato devidamente atualizado.
Considerando as circunstâncias acima elencadas e em atenção ao contido no art. 293, caput e § 1º, da Lei 9.503/97, determino a proibição de se obter a permissão ou habilitação para dirigir veículo automotor em relação ao sentenciado Jailton Soares Bezerra pelo prazo de 3(três) anos.
Em atenção ao contido no art. 295 do referido Diploma Legal, oficie-se ao Conselho Nacional de Trânsito – CONTRAN e ao Departamento Estadual de Trânsito – DETRAN informando o teor desta decisão.
Oficie-se, também, ao Comando-Geral da Polícia Militar do Estado de Sergipe, encaminhando cópia desta decisão.
Determino ainda, que seja o nome do sentenciado Jailton Soares Bezerralançado no Rol dos Culpados, após o trânsito em julgado desta decisão, fazendo-se as anotações e comunicações de estilo, inclusive, ao TRE (artigo 15, inciso III, da Constituição Federal), observando-se também, as cautelas do art. 5o, inciso LVII da Constituição Federal.
Publique-se. Registre-se. Intime-se. Cumpra-se.

Campo do Brito, 17 de setembro de 2014.

Elaine Celina Afra Santos Dutra
Juíza de Direito

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